"O Império Invisível" / "เอ็มไพร์ที่มองไม่เห็น"ของการถ่ายภาพโปรตุเกสในประเทศไทย
Por ocasião do lançamento da revista anual “
XXI, Ter Opinião”, publicada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, e depois de ter lido o artigo “Crise, crença e criação” escrito pelo Professor Jorge Calado no primeiro número da revista, fiquei a pensar na citação que fez de Winston Churchil e que nos recorda que, criticado por gastar dinheiro no apoio às artes, terá respondido: “Mas não é para salvar a cultura que estamos em guerra?” Os períodos de crise são favoráveis à criação artística e científica? O artigo responde à pergunta a que já me tinha respondido Jorge Calado – depende daqueles que nos governam nessas alturas.
Neste preciso momento Portugal está em crise, esta é a nossa guerra. Não se trata de uma guerra convencional de trincheiras ou de bombardeamentos aéreos. É uma guerra de valores, interesses económicos, jogos de poder e de influência; tempo inquieto de decisões inadiáveis, com danos colaterais de dimensões imprevisíveis que vão incidir no desemprego, na fome e na miséria das populações. Uma guerra para onde os portugueses foram arrastados pela “Europa Unida”, da qual fazem parte e a ela conduzidos pelos seus governantes. Uma guerra que não se confina a Portugal e nem se limita ao velho continente. Mesmo assim, os responsáveis políticos pela condução e planificação cultural, na atual situação económica que Portugal atravessa, também eles, têm que ser criativos, não podem reduzir a sua ação apenas a uma economia de gastos e conduzir o país a um vazio cultural inaceitável.
Nessa mesma noite acabaria por ficar à conversa com o Professor. Falámos do que os dois gostamos muito, da fotografia, disto e daquilo, coisas que a poucos interessa. Jorge Calado acabaria por me contar que alguém numa universidade em Camberra pretendia informações sobre os fotógrafos do século XIX na Ásia, mais concretamente na Ásia banhada pelo oceano pacífico. Nem de propósito, pois o meu irmão, Miguel Castelo-Branco, estava a trabalhar na exposição “
Das Partes do Sião”, que integra as Comemorações dos 500.º aniversário das relações Luso-Tailandesas. Eu tinha adquirido recentemente para a minha coleção uma quantidade considerável de fotografias da autoria de
Francisco Chit e Joaquim António, quiçá os maiores expoentes da história da fotografia no Sião. Tudo parecia conjugar-se sem que nada tivesse sido programado. Algumas das fotografias que fazem parte dessa aquisição (
O retrato do Rei Chulalongkorn, 1873 feito por Francisco Chit; os “protegidos chineses” fotografados por Joaquim António frente ao consulado português em Bangkok aquando do aniversário do Rei D. Carlos em 1899 e um grupo de músicos da Sociedade Philarmonica de Bangkok em 1900 onde identificámos o fotógrafo Joaquim António) acabariam por figurar na exposição “Das Partes do Sião”, na Biblioteca Nacional de Portugal e que recomendo ser visitada até dia 18 de Fevereiro de 2012. São estes os momentos em que podemos reencontrar aliados que são fruto da nossa relação com os povos e as nações em outras alturas da história.
© Coleção Ângela Camila Castelo-Branco e António Faria
Segunda coroação do Rei Chulalongkon, em Outubro de 1873, Sentado com regalia (coroa, ceptro, sandálias, caixa de bétele, escarrador, incenso...). Fotografia de Francis Chit (Khun Sunthom Sathitsalak), 1830-1891. Papel albuminado colado sobre cartão, dimensões: 26,3 x 22 cm.
© Coleção Ângela Camila Castelo-Branco e António Faria
Fotografia de Francis Chit ca. 1869. Papel albuminado colado sobre cartão, dimensões: 23 x 18 cm.
No catálogo da exposição podemos ler sobre a Época de Ouro dos Protukét do Sião: “Houve alguém que um dia se referiu a um «Império Sombra» português localizado a Oriente do Cabo da Boa Esperança. Outro Investigador chamou-lhe «Império Informal». Não havia sido nem comprado, conquistado ou financiado por Goa ou Lisboa, mas fora-se povoando de forma pacífica por soldados retirados do serviço activo, bem como por fugitivos. Casaram, assentaram e ficaram”. Miguel Castelo-Branco chama-lhe «Império Invisível», esclarecendo que “estava por todo o lado e em local algum, nem era entendido como tal nem pelos seus membros nem pelos povos a que se acolhiam, mas que, no entanto, funcionava como uma poderosa rede clientelar, de afectos e defesa de uma certa ideia de fraternidade universal muito parecida com a cultura de resistência, teimosa mas inaudível, da diáspora judaica.
Porém, ao contrário de judeus e arménios, que se encontravam um pouco por todo o Oriente tocado pelas rotas comerciais árabes e persas, as lusotopias mestiças identificavam-se com um estado presente no continente (Portugal), ligando-se-lhe por laços, vagos mas poderosos de lealdade cultural, linguística, mas sobretudo religiosa.”
Sobre as imagens do Sião nos séculos XIX e inicio do XX, atrevo-me a afirmar que, no que diz respeito à história da fotografia no mundo, também existe um “Império Invisível”. No mesmo catálogo “Das Partes do Sião”, Miguel Castelo-Branco escreve sobre Francisco Chit e Joaquim António, fotógrafos:
Autoretrato de Luang Akani Naruemitr, aliás Francis Chit quando era ainda Khun Sunthorn Satisluksana, títulos que lhe foram concedidos por Rama IV e Rama V.
“O primeiro fotógrafo profissional do Sião foi um Protukét, filho de Teng, chinês católico casado com uma Protukét de Thonburi, Francisco Chit (1830-1891) estudou na escola do palácio. O Rei Mongkut dele fez fotógrafo oficial, concedendo-lhe o título de Khun Suthorn Satisalak É possível que as primícias do jovem Francisco tivessem sido estimuladas ou por um padre da paróquia de santa Cruz de Thonburi – Larnaudie, um entusiasta da fotografia. Francisco recebia diariamente entre as sete e as onze horas da manhã, aproveitando a luz natural que coava pela clarabóia do estúdio, oferecendo aos clientes fotos em formato carte de visite ou cabinet, coladas sobre cartões de cor rocha, verde ou preta. Dava, porém, preferência a fotos de exteriores, escolhendo o Ananta Samakon, nas cercanias do palácio real ou Bang Pa-In, residência de Verão do Rei, para explorar as potencialidades da luz solar. Ao longo de dois reinados que serviu como fotógrafo oficial, fotografou vistas das mais importantes cidades do reino, a arquitectura monumental da capital e a sua transformação. Acompanhou o jovem Rei Chulalongkorn na visita a Singapura e às Índias Orientais Holandesas. Francisco sabia negociar e cultivava com grande desembaraço as novas técnicas da publicidade. Adaptou o nome de baptismo, dando-lhe a ressonância cosmopolita de Francis e anunciava com frequência nas páginas do Siam Mercantile Gazette, no Bangkok Times, Bangkok Summary e Bangkok Recorder – jornais em língua inglesa – bem como na imprensa em língua thai. Em Janeiro de 1865, nas páginas do Bangkok Recorder [«Francis Chit», in The Bangkok Recorder, 14 January 1865, p.6.] apresentava-se como artista de grande potencial, habilitado para tirar fotografias de todos os formatos e possuidor de port-folio com vistas de Bangkok, cenas campestres, edifícios públicos, templos, palácios e figuras destacadas das hierarquias civil e religiosa do país. Para marcar os seus produtos usava selos da sua autoria: Francis Chit Bangkok, F. Chit, F. Chit & Son, by Appointment Photographer to H. M. e, depois, Khoom Soondr Sadislack [...].
Selo de Francis Chit no verso de uma carte-de-visite
Como bom homem de negócios, Francisco Chit sabia prever o futuro e investiu na família. Do seu primeiro casamento, nasceram quatro filhos, dois dos quais seguiram as pisadas do pai. Tong Dee, que herdou a empresa de Francisco, era um homem de talento. Foi o primeiro siamês a receber formação técnica e artística na Alemanha, onde passou quatro anos como aluno aprendiz de Bernhard Kindermann Ao regressar ao Sião, aprofundou a parceria com o pai e foi-se lentamente apossando da atividade da empresa. Rama V fê-lo Khun Chaya Sathisakon. Ainda do primeiro casamento, uma outra vocação. A sua filha Soi era, também, aficionada da fotografia e explorou com sagacidade a sua condição de mulher. A Cidade Interior – isto é, o gineceu – estava vedada a homens, pelo que Soi ali se introduziu como artista de fotografia, respondendo à febre pelas imagens que contagiava a alta sociedade siamesa. Quando Rama V visitou a Europa, em 1893, a Rainha Saovabha Bongsri ocupou a regência durante a ausência do seu real esposo. Para muitos actos a que presidia na condição de regente, requereu os trabalhos de Soi. De um segundo casamento, Francisco teve um filho chamado Tam, que não foi apenas fotógrafo como o pai, mas também cineasta. Nai Tam teve um filho, igualmente fotógrafo profissional e a sua linhagem familiar e artística prolongou-se até finais do século XX.”
Musicos, Bangkok, postal n.º 457 a partir de fotografia de Joaquim António ca. 1902.
“Joaquim António nasceu em Macau e aí terá frequentado o ensino básico e, depois, recebido formação técnico-profissional em Hong Kong, onde obteve diploma de Construção de Obras Públicas e Minas. São obscuros os primeiros anos da sua estadia no Sião, mas sabe-se que trabalhou como desenhador técnico para o Departamento de Caminhos-de-Ferro. Depois, instalou-se por conta própria abrindo um estúdio na Charoen Krung – principal artéria comercial de Bangkok – aí recebendo os melhores clientes: os ricos e os influentes. Homens de negócios, os príncipes da parentela real e os diplomatas estrangeiros em missão de visita a Rama V pousavam para a sua objectiva, em frente de cenários de papelão e estuque ou nos exteriores. Fizera trabalhos para a legação britânica, que lhe valeram a admiração e carta de recomendação de Mr. Burnes – Chargé d’Affaires daquela representação diplomática – a um dos irmãos do Rei.
Convidado para fotógrafo da casa real, António expôs trabalhos seus na Exposição de Hanói (1902), já na condição de «fotógrafo do Rei do Sião», aí apresentando «uma bela colecção de fotografias que nos iniciam no charme da aldeia e dos campos siameses, dos tipos masculinos e femininos, interessantes pelo etnográfico, nos trabalhos empregues para a cultura do arroz, tão característico, mau grado as tendências progressivas de S. M. o Rei Chulalongkorn».
Dois anos volvidos, apresentou-se na Feira Mundial de Saint Louis (1904), onde foi premiado com uma medalha de prata pela «melhor colecção de vistas do Sião e países vizinhos».
Em 1904 lançou
The 1904 Traveller’s Guide to Bangkok and Siam, o primeiro guia turístico publicado no Sião.” [vide Albert Ducarre – Mission à l’exposition de Hanói et en Extrême – Orient: [1902-1903]: rapport general. Paris: [s.n.], 1903, p.65. Charlton Bristow Perkins – Travels from the grandeurs of the West to mysteries of the East. San Francisco: The CB Perkins Company, 1909, p. 325.]
Parece que o Sião é um caso único e muito particular da fotografia no Sudeste-Asiático, onde destacamos a paixão pela fotografia por parte da família real e ao mesmo tempo uma forte resistência à intrusão de fotógrafos estrangeiros no território.
Pensamos que estes dois factores contribuíram para a importância de Francis Chit, e mais tarde de Joaquim António, na fotografia fixada na Tailândia, até porque, os dois terão sido uma espécie de "cronistas de imagem" da família real tailandesa durante pelo menos 60 anos em que a acompanharam em viagens, nos eventos oficiais e na corte.
Ângela Camila Castelo-Branco e António Faria
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